No nosso conteúdo anterior falamos sobre a norma IEC 61000-4-30 e concluímos o que é de fato usual para realizar medições propriamente ditas e o que é característica construtiva, inerente ao fabricante de analisadores. Aqui falaremos sobre os anexos desta. 

Em termos de quantidade de páginas, os anexos são quase metade da própria norma, e trazem detalhes importantes e ricos na hora de aplicar as técnicas de medição, utilizando de ferramental qualificado.

Procedimento para medição de qualidade de energia

Chegamos ao primeiro anexo da norma! Esta parte apresenta os conceitos para realizarmos uma medição classe A, e meus amigos, algumas informações daqui devem estar no seu relatório e outras você deve saber antes de gerar um relatório ou medir algo.

Ela elucida, em suma:

  • Precauções de instalação;
  • Transdutores;
  • Tensões e correntes transitórias;
  • Variações rápidas de tensão;
  • Corrente;
  • Características de afundamentos de tensão;

Vamos ao super resumo de cada um desses itens…

Precauções de instalação

Nesta seção ocorre a menção à norma IEC61010, que trata da segurança de equipamentos de inspeção e medição. Regras e cuidados para instalação de natureza temporária ou permanente, conexão de cabos e pontas de prova de tensão e corrente, acesso a partes vivas, acomodação do instrumento, aterramento, e interferência. São inúmeros cuidados que visam dar segurança às pessoas, à instalação, ao equipamento, e à medição, pois queremos que o resultado esteja correto! Só aqui temos assunto para um novo artigo! Acredito que a leitura é obrigatória a todos, e a elaboração de um check list explorando e garantindo que todos os inúmeros requisitos foram atendidos também é obrigatória. 

Norma IEC

Transdutores

A norma explica a necessidade de uso destes, uma vez que adequações aos níveis de tensão, ou ainda do uso de sensores de corrente para coleta de amostras de sinal, são amplamente usados. Estamos falando tanto dos acessórios dos próprios equipamentos como as bobinas de rogowski e pontas de prova, quanto de derivações do tipo “shunt”, e TCs e TPs (Mais comuns) para nivelamento e adequação dos níveis e limites de medição. Neste caso, é imprescindível para uma análise, o conhecimento da linearidade e resposta em frequência do transdutor para que possamos entender o comportamento de alguns fenômenos e extrapolarmos incertezas, ou seja, se há um transdutor, ele deve ser conhecido e suas incertezas devem ser mencionadas e ponderadas na análise. Um transformador de corrente, por exemplo, varia de classe de precisão, relação, material, seção e etc., e geralmente a frequência de corte varia de 1 até alguns poucos kilohertz, isso afeta, por exemplo, a resposta de fase, quando próximo da frequência de corte. Isso deve ser levado em conta quando avaliamos um transiente oscilatório, e dimensionamos filtros, por exemplo. Tal ponderação afetaria o dimensionamento de um filtro. É importante, no relatório que haja a ponderação da existência do transdutor, e citação a este, para que o leitor possa ser levado a uma conclusão, tendo uma visão geral do sistema medido.

Transientes e mudanças rápidas e afundamentos

A norma se aprofunda quanto à medição de transientes e mudanças rápidas de tensão, que são transições entre dois regimes permanentes, e afundamentos de tensão (que são mais comuns no dia a dia). Note que, como quase tudo na engenharia elétrica, são diferentes as análises em Regime Permanente, e em Regime Transitório. Aqui a norma aborda questões como saturação, frequências de corte e operação , exclusão de transdutores, entre outros aspectos mais específicos a situações igualmente peculiares. Em resumo, responda estas duas perguntas antes de medir:

  • Os níveis de sinal utilizam a plena escala do instrumento?
  • A frequência de operação é adequada ao sinal medido?

Sendo sim as respostas, o equipamento e transdutor são adequados à medida.

Por sorte, a maioria dos fabricantes deixa explícito os limites do equipamento para os seus transdutores, logo, é importante adotar ferramentas e acessórios com dados conhecidos, ensaiados e publicados, obviamente. Assim pode-se avaliar o sistema por completo, agrupar sensores compatíveis, e obviamente chegar a alguma conclusão.

Norma IEC

A norma cita os fenômenos, os classifica, denomina e chama atenção aos cuidados na hora de medir, no entanto, não espere ver direcionamentos mais precisos de análise (Como medir, com o que medir, interpretar ou concluir).

Corrente

Faço uma grande ressalva e chamo a atenção a um detalhe que pode ter passado despercebido: Até então só falamos de TENSÃO! Então sim! Um equipamento pode ser classe A sem medir corrente, logo a norma trata a medição de corrente como algo útil, mas em caráter complementar, sob responsabilidade de cada fabricante, garantir o mesmo padrão de precisão apontado anteriormente nos parâmetros definidos e explícitos no começo desta publicação.

Ela cita limites e incertezas aceitáveis, mas não descreve ensaios. Então avalie e tome cuidado para utilizar um equipamento que siga o rigor de classe também na medição de corrente, seja em magnitude, fase, incerteza, e etc.. Note que o Fator de Potência, por exemplo, necessita de tal medida, mas sequer é mencionado nesta norma. Isso vale também para harmônicas de corrente, avaliação de inrushs, etc. O PRODIST módulo 8, por exemplo, trata tal parâmetro com obrigatoriedade, logo, é desejável que um equipamento atenda a esta e outras necessidades de medição também, como o RE8000 da Embrasul.

Norma IEC

Terminologias importantes

Transitório: Fenômeno ou uma grandeza que varia entre 2 estados de regime permanente consecutivos durante um intervalo de tempo, quando comparado a escala de tempo de interesse.

Surto: É uma onda transitória de tensão, propagada ao longo de uma linha ou um circuito, caracterizada por um rápido crescimento, seguido de uma queda mais lenta.

Mudança rápida da tensão: Transição rápida da tensão eficaz entre 2 regimes permanentes. (Note que apenas há um direcionamento do termo mais amplo “transitório” para um “transitório de tensão”, definindo a grandeza que era abrangente na definição de transitório).

Inrush: É uma corrente de energização transitório. 

Frequência Inter-harmônica: Qualquer frequência que não seja múltiplo inteiro da frequência fundamental

Medição de qualidade da energia elétrica: Recomendações para aplicação

Aqui podemos dividir e já direcionar 2 grandes classes de aplicação.

Medições com propósito ou possível propósito contratual

Para estas, classe A, pois falamos de conformidade com algo acordado entre partes. Aqui é muito comum o vínculo ao PRODIST e a mais de um módulo deste, uma vez que o PRODIST estabelece regras para medição específicas, limiares, e também para aspectos de atendimento, ressarcimento e etc. A norma inclusive cita que “uma norma deve ser o ponto de partida”: PRODIST, por exemplo. Lembre-se, essa norma discute técnicas, e não limites. Mais adiante a norma também fala sobre como configurar o equipamento para medir, dependendo do fenômeno. Aqui ressalto que IEC e PRODIST estão em consonância, pois exigem configurações semelhantes. Eu recomendo fortemente que estas 2 normas sejam citadas em auditorias com tais fins: IEC 61000-4-30 e PRODIST, tantos quantos forem os módulos necessários.

Medições para fins estatísticos e estudos

Classe S. Aqui a norma também cita “consumidores, e rede supridora”, no entanto, entende que pode se tratar de uma avaliação contínua e de fato estatística, inclusive indicando a necessidade de aumento de classe na medição para eventual parâmetro de desvio na S. Ressalto que acho que pouco provável (opinião). A Classe S, dentro do atual cenário normativo brasileiro, atende com louvor a esmagadora maioria dos casos. É comum, dentro do que já avaliei dentro dos meus anos de experiência aqui na Embrasul, ver ampla utilização de equipamentos de classe S por inúmeros engenheiros e empresas. Os analisadores classe S atendem quase que na integridade avaliações internas ao ponto de acoplamento, inclusive no ponto, entregando uma análise PRODIST completa, caso do RE7000 e seus irmãos 7080 e 7040.

Equipamentos de classe A, como o analisador de energia RE8000, transitam entre situações jurídicas de comprovação, como as citadas em norma, mas também são indicados para  comissionamentos de usinas, laboratórios, cargas sensíveis e/ou complexas, entre outras, ou seja, para inúmeras aplicações, ambas as classes atendem, e para restritas, há um direcionamento mais específico, então, sempre que for realizar uma medição ou campanha, utilize uma ferramenta de acordo com a situação e problemas a serem resolvidos. A esmagadora maioria de aplicações não está citada na norma. E se precisar, nossa equipe de aplicação pode ajudar nisso.

Prioridade de Grandezas

Os equipamentos da Embrasul, realizam as medições dos parâmetros avaliados simultaneamente, em toda sua linha, no entanto, nem todo equipamento tem tal capacidade, logo, a norma define as prioridades de medição, sendo elas:

  1. Parâmetros elétricos (V, I, P, Q, S, DPF, TPF, e etc.);
  2. Afundamentos/elevações de tensão;
  3. harmônicos de tensão;
  4. harmônicos de corrente;
  5. desequilíbrio;
  6. transitórios;
  7. Flicker;
  8. Inter-harmônicos de tensão e corrente;
  9. comunicação de sinais em tensão através da rede.

Ou seja, a norma prioriza aspectos contínuos presentes em regime permanente, em detrimento de eventos transitórios, se houver a necessidade de medição consecutiva, não simultânea.

Integração de Grandezas

Para cada um destes parâmetros acima citados, a norma aborda um tempo de integração, ou melhor, uma agregação recomendada: 10s, 10 min, 2h, 3s, 200ms, entre outros. E aqui chamo a atenção que, diferente do PRODIST, que obriga 1008 registros válidos em 10 minutos, a IEC61000-4-30 aborda de forma individual, cada parâmetro, com múltiplas integrações simultâneas. Inclusive é possível ver, ao longo da norma, que o PRODIST também traz semelhanças com a IEC 61000-4-30, uma vez que suas regras são similares a de alguns parâmetros, como por exemplo: Magnitude de tensão de alimentação, que entende que a agregação deve ser realizada em 10 minutos pelo mesmo período de uma semana. 

Saliento que nem todos os equipamentos têm tal capacidade de múltiplas agregações, logo, para atendimento pleno e para poder embasar e acatar a escolha recomendada nesta norma, o equipamento utilizado tem de permitir tal capacidade, caso contrário, uma ou limitadas agregações podem não permitir um estudo simultâneo de todos os parâmetros, obrigando a medições consecutivas, respeitando a prioridade das grandezas, mas também estendendo o período de medição.

É comum que analisadores e medidores possuam capacidade de integração de uma ou duas agregações. Não é trivial no mercado, um equipamento possuir todas as agregações diferentes por parâmetro, simultaneamente, como possível no RE8000.

Abaixo apresentamos as principais recomendações com relação a estes aspectos:

Frequência Industrial1 semanaAgregação de 10 segundos
Magnitude da Tensão de Alimentação1 semanaAgregação de 10 minutos
Flicker1 semanaAgregação de 10 minutos 
1 semanaAgregação 2 horas (Plt).
Afundamentos de Tensão1 anonão informado
Interrupções1 anonão informado
Desequilíbrio de Tensão da Fonte1 semanaAgregação de 10 minutos e/ou 2 horas
Tensões Harmônicas1 semanaAgregação de 10 minutos
1 semanaAgregação 150/180 ciclos
Tensões Inter-harmônicas1 semanaAgregação de 10 minutos
1 semanaAgregação 150/180 ciclos
Sinais de Comunicação em Tensão da Rede Elétrica1 semananão informado

Tais períodos e agregações podem causar certa estranheza, no entanto, lembre-se que uma ponderação deve ser feita antes do ato de medir. Tais valores podem e devem variar conforme o objetivo, e devem respeitar a norma de referência. É o famoso: “Para cada caso um caso”, definir uma regra absoluta para qualquer aplicação não é possível.

Uma boa estratégia, na dúvida, é utilizar períodos maiores de medição, com integrações menores. Tal estratégia permite integralizações para períodos maiores, e garantem que não haja falta de registros por expurgos e etc. Em resumo, se utilizares uma integralização de 200ms, é possível reintegraliza-la para 10 minutos. O contrário não é verdade. No que tange a tempo de medição, se precisa de 1 semana, ou 1008 registros de 10 minutos. Adicione 2 dias a mais ou faça 14, de forma a poder escolher uma janela conveniente e útil para medição, evitando o problema de falta de registros.

Comparação de Resultados

Já nos encaminhando para o fim deste conteúdo, a norma também cita como comparar e apresentar os resultados e limites contratuais. Note que se trata de uma análise estatística, e para cada parâmetro uma seleção específica é necessária, ou seja, não utilizar isso para todos e quaisquer parâmetros. A norma aborda pontualmente, cada método para cada parâmetro, mas para facilitar, e compilar, trago a metodologia que ela apresenta, e o leitor classifica o que é útil para cada parâmetro.

  • Número ou % de valores durante a medição que ultrapassaram o limite para mais ou para menos;;
  • Valores de pico (em intervalo igual ou diferente);
  • Valores semanais de Probabilidade 95% ou 99%, expressos na grandeza;
  • Número de valores consecutivos excedendo limites;
  • Número de desvios da nominal.

Para cada um dos parâmetros e fenômenos elétricos, tais métodos podem fazer sentido ou não, então, para um bom embasamento de relatório, verifique exatamente o parâmetro e o método de comparação, para que sua análise esteja conforme esta norma. Mas não se limite a isso! Pecar por excesso é aconselhável. Sempre mostre tantos quantos forem os dados necessários para pleno entendimento do leitor. A norma apresenta o mínimo necessário. 

A título de curiosidade, o PRODIST, no módulo 8, também apresenta uma metodologia.

Fatores de decisão

Existem fatores de decisão não explícitos na norma. Veja alguns:

Localização

Em que ponto do meu diagrama eu meço? Aqui uma análise do especialista é necessário pois fatores como viabilidade, custo, proximidade com a carga, entre outros afetam tal escolha e podem variar a cada caso, logo, tenha em mente as implicações de erro, ambiente, acesso de pessoas, e demais variáveis não explícitas aqui e nem na norma, que podem afetar a campanha/medição.

Objetivos

Dependem da razão da realização, e com base nisso, definem-se parâmetros, tempo de integração, equipamentos, custo, limiares, e validação e expurgos, ou seja, campanhas permitem maior poder de escolha, e decisão, mas a norma cita cuidados como “Reúna a maior documentação possível”

  • Registros de alterações;
  • Conhecimento de cargas perturbadoras e regimes de operação;
  • Detalhamento do problema
  • Busca por coincidências (Talvez tenhamos que realizar medições simultâneas, em diferentes pontos, para provar algo por inferência e inspeção). 

Veja, a norma nos dá os cuidados que temos de ter antes de assumir uma medição, campanha, estudo, e como reunir informações que nos ajudem a levar a alguma conclusão, afinal, é isso que se procura, uma conclusão para algo.

Preparação para campanha

Finalmente, chegamos ao encerramento desta norma. Trago alguns pontos citados na norma, que são importantes na hora de realizar o estudo para encerrar este conteúdo. E caso tenha interesse no aprofundamento desta, a aquisição e leitura é aconselhada e disponível no catálogo da ABNT, disponível em pesquisa simples no google.

  • Defina o número de fases e a tensão de referência;
  • Defina a medição de corrente e seus ranges e transdutores;
  • Defina os limiares interpretáveis e o período de monitoração;
  • Caracterização o ponto medido com o máximo de informações à respeito;
  • Definia os Indicadores estatísticos de análise (%, máx, mín, méd…) para condensar um número grande de valores;
  • Defina as referências de análise e comparação para cada parâmetro com nível de confiança maior ou igual a 95%;
  • Aponte a conformidade contratual e requisitos do operador/consumidor;;
  • Em resultados, realize a contagem e tabulação de eventos;

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